domingo, 10 de março de 2019

Ludovina, heroína da guerra do Paraguai - Por Neila Barreto


Ludovina Portocarrero simboliza a família de militar, por ter demonstrado na sua vida de esposa, mãe e avó de soldado, determinação, liderança, coragem, abnegação e fé cristã..

 

Ana Ludovina Alves de Oliveira nasceu a 08 de novembro de 1828, em Corumbá-MS, e faleceu em 07 de outubro de 1912, no Rio de Janeiro. Casou-se com o pernambucano General Hermenegildo de Albuquerque Portocarrero, o Barão de Coimbra, nascido a 13 de abril de 1818, filho de Luiz da Costa Ferreira e Anna Pinto Portocarrero de Mello e Albuquerque, falecido a 12 de setembro de 1893, no Rio de Janeiro.


Após o casamento passou a assinar Ludovina Portocarrero e recebeu como honraria o título de Baronesa do Forte de Coimbra.

A baronesa de Coimbra era filha do português Pedro José Alves de Oliveira, capitão honorário e comandante do depósito de pólvora da Ilha de Santa Bárbara e Maria Eugenia Alves de Oliveira, natural da República Oriental do Uruguai.

Recebeu o título de “Patrona da Família Militar” e, a data de 08 de novembro de 1828, dia do seu nascimento, passou a ser o dia oficial da Família Militar, conforme pesquisas históricas realizadas pelo Estado Maior das Forças Armadas, as quais conduziram o título para uma figura feminina, em detrimento de um herói ou militar de escol, lugar comum na escolha dos patronos das armas e serviços.

Assim sendo, foram relacionados inicialmente as senhoras de diversos patronos e mais, Maria Quitéria – Anita Garibaldi e Ludovina Portocarrero.

O estudo comparativo, possibilitado com dados retirados de documentos do Arquivo do Exército e, ainda, obtidos em consulta a estudiosos e historiadores, possibilitou selecionar o nome de Ludovina Portocarrero como aquela que melhor simbolizava a família do militar, por ter demonstrado na sua vida de esposa, mãe e avó de soldado, determinação, liderança, coragem, abnegação e fé cristã.

Todas essas qualidades foram ressaltadas, quando acompanhando o seu marido Ten. Cel. Hermenegildo de Albuquerque Portocarrero na inspeção do Forte Coimbra, foi essa praça de guerra surpreendida com o ataque de tropas paraguaias, no triste episodio da Guerra da Tríplice Aliança.

As ameaças do comandante inimigo, bem como, as investidas posteriores das tropas guaranis, em nada atemorizou Ludovina Portocarrero, que sentindo a necessidade de maior presença de homens nas muralhas do forte, liderou o trabalho de setenta mulheres, organizando o apoio logístico, moral e espiritual dos defensores, fator decisivo para a evasão de toda a guarnição, sem nenhuma baixa, conforme consta documento datado de agosto de 1988, assinado pelo Cel. Reinaldo Correia Moreira, chefe do Estado-Maior do Exército, à época.

Para o historiador Maj. Gema Cláudio Moreira Bento, Ludovina liderou entre as mulheres o apoio logístico aos defensores e a resistência moral e espiritual. No auge da luta passou simbolicamente, o comando do forte à Nossa Senhora  do Carmo, ao depositar aos pés da imagem a banda de seda vermelha do uniforme do seu marido, conforme consta da Revista Militar Brasileira, edição dedicada ao Bicentenário do Forte de Coimbra.


Nas noites de 27 e 28 de dezembro de 1864, setenta mulheres comandadas por Ludovina Portocarrero manufaturam com o auxílio de buchas fabricadas, inclusive, com suas próprias vestes e pela adaptação de projéteis de maior calibre, 3.500 balas de fuzil.  As mulheres, também, assumiram os encargos de rancho e abastecimento às posições, para aumentar o número de soldados nas muralhas.

Quando a situação no forte se tornou gravíssima, Ludovina Portocarrero pediu ao soldado músico Verdeixas que subisse nas muralhas do forte e mostrasse aos assaltantes a imagem de Nossa Senhora do Carmo. Ele elevou a imagem da Padroeira bem alto sobre sua cabeça e gritou: “Viva Nossa Senhora do Carmo”. Em resposta, irmãos separados pela guerra, mas unidos pela fé religiosa, descansaram armas e passaram a gritar: “Viva Nossa Senhora do Carmo” e os atacantes “Viva Nuestra Senhora”. Era o tempo que Ludovina precisava para dotar a guarnição de água de beber.

Esses vivas misturados com saudações demoraram o tempo suficiente para duas heroínas de Coimbra, mulheres simples do povo, - Aninha Cangalha e Maria Fuzil -, descerem até o rio em busca de água para os defensores militares matarem a sede e recobrarem o ânimo para a resistência. Após resistência de dois dias, a guarnição do forte, decidiu pela retirada, na noite de 27/28 de 1864, sem ser pressentida pelo inimigo. À frente do cortejo a imagem de Nossa Senhora do Carmo nos braços da menina Carlota Albuquerque Portocarrero, filha do Comandante e Ludovina. Alcançaram Corumbá apesar da perseguição da esquadra inimiga.

Ludovina era uma mulher de coragem , alma pura, inteligência lúcida, ânimo forte e temperamento resoluto, companheira inigualável que soube ficar ao lado do seu marido nas horas amargas, mãe sublime que defendeu o filho amado com o escudo do seu próprio corpo, santa que rezou com verdadeira fé,  mulher boníssima que mitigou as dores dos feridos e encorajou os mais tímidos, brasileira notável que honrou o seu pais, dando ao inimigo uma demonstração viva do valor do povo civilizado e altivo, conforme publicação, no Jornal do comercio de 15 de outubro de 1912, do Rio de Janeiro.

A dinastia dos “Portocarrero” tem sido numerosa no Colégio Militar. São quatro gerações de ex-alunos, a maioria pertencente ao exército, onde atingiu postos de coronel e general. Ludovina e Hermenegildo tiveram muitos filhos. São descendentes de Ludovina Portocarrero, a atriz Tônia Portocarrero e o arquiteto José Afonso Bottura Portocarrero, professor da Universidade Federal de Mato Grosso-UFMT.

A imagem de Nossa Senhora do Carmo, sem incidente, atingiu Cuiabá e foi abrigada na Igreja Matriz de São Gonçalo, segundo relatos oficiais e, hoje se encontra em Corumbá-MS.

Ludovina Portocarrero é um exemplo de mulher frágil e forte, ao mesmo tempo. Inteligência e sensibilidade que anima muitas Ludovinas espalhadas pelo nosso Brasil.

(*) NEILA BARRETO SOUZA BARRETO é jornalista, escritora, historiadora e Mestre em História e escreve às sextas-feiras para HiperNotícias.
 E-mail: neila.barreto@hotmail.com 
Site: www.neilabarreto.com.br 

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